terça-feira, 10 de julho de 2012

"Um país invertebrado", por Vasco Graça Moura


"A defesa e valorização da nossa língua no plano internacional, muito em especial junto das instâncias da União Europeia, tem sido preocupação constante de alguns parlamentares. Nos tempos em que exerci o mandato de deputado ao Parlamento Europeu não fui o único a envolver-me nessa questão, sendo justo salientar nomes como os dos então meus colegas Edite Estrela e José Ribeiro e Castro, aquela reforçando frequentemente a insistência na não marginalização do português no trabalho das comissões e este procurando consagrar por vários modos o reconhecimento efectivo da projecção internacional do português.
É precisamente de José Ribeiro e Castro um artigo publicado no Expresso de 19.2.2011, sob o título "Requiem pela língua portuguesa", a propósito da cooperação reforçada que visa privilegiar as línguas inglesa, francesa e alemã, no tocante ao registo de patentes.Só posso aplaudir o que ele diz. E corroborar o princípio, mais do que evidente quanto às línguas nacionais, de que não são admissíveis línguas de primeira e línguas de segunda na União Europeia. Muito embora se possa compreender que o registo de patentes se simplificaria consideravelmente se se reduzisse o número de idiomas em que é admitido, não se pode aceitar esse argumento: de outro modo, também se simplificariam todos os pro- cedimentos e se economiza- riam verbas astronómicas se fosse dispensado o recurso às vá- rias línguas nacionais, quer nas várias instâncias europeias, quer no resto do mundo... 
A União Europeia tem necessariamente de pagar o preço da sua diversidade linguística e da sua pluralidade cultural.Todavia, se é certo que estou plenamente de acordo com Ribeiro e Castro quanto a todos os pontos por ele aflorados, devo dizer que Portugal tem o que merece. O nosso país, pela mão obscena dos seus políticos, tem perpetrado tão implacavelmente o assassínio da sua língua materna, com a alegre colaboração de alguma comunicação social, que as patentes são pequenas bodelhas boiando no vasto oceano de tanta irresponsabilidade.
A maneira como essas entidades se prestaram a acatar uma ignomínia, aliás inaplicável, que dá pelo nome de Acordo Ortográfico é eloquente: para não falar já nas trapalhadas relativas ao emprego do hífen e ao uso de maiúsculas e minúsculas, acontece que ninguém é capaz de fazer funcionar correctamente as suas regras, por ser impossível determinar, no tocante às chamadas consoantes mudas, quando é que elas se mantêm, por serem pronunciadas num ou noutro dos lados do Atlântico, e quando é que elas se suprimem, por não o serem em nenhum deles."